Ryan Moulton, engenheiro do Google, defendeu seu trabalho e, consequentemente, do Google no X após a disponibilização dos documentos pelo Departamento de Justiça (DoJ).
Ao argumentar a queda da qualidade da Internet, no geral, ele voltou a defender que a crise passa pelo jornalismo, que parou de fazer um trabalho de verdade, passando, agora, a trabalhar apenas por cliques, utilizando uma postagem feita no ano passado.
Após repercussão, Moulton, apagou a nova conexão entre os temas. Entretanto, a postagem antiga continua disponível.
Segundo ele, a internet de alta qualidade que conhecíamos era um “excedente” da era em que o jornalismo impresso gerava receita suficiente para sustentar a produção de “texto escrito profissionalmente”, um mercado que ele agora considera “muito, muito pequeno, se é que existe”.
Embora a análise de Moulton sobre a fragilidade econômica do jornalismo toque em um ponto sensível, sua perspectiva, vinda de dentro do Google, foi recebida com ceticismo e críticas contundentes pela comunidade online, que rapidamente questionou o papel da própria gigante das buscas nesse cenário.


[ATUALIZAÇÃO] Agora, o engenheiro também protegeu seus tweets.

Quem causou isso?
A principal crítica à linha de pensamento de Moulton veio de figuras como Mike Futia, que não hesitou em apontar a ironia e a aparente desconexão da análise do engenheiro com as próprias ações do Google. Futia resumiu o sentimento de muitos em um post viral:
“Você literalmente não pode inventar isso. Engenheiro do Google Search @moultano >> que trabalha para a empresa que destruiu milhares de negócios de pequenos editores com o HCU [Helpful Content Update] >> sobre por que a qualidade da Busca declinou: ‘o mercado para realmente escrever conteúdo basicamente desapareceu’.”
Em seguida, Futia questionou diretamente: “Puxa, e quem você acha que causou isso?”, uma pergunta retórica que ecoou a frustração de inúmeros editores e profissionais de SEO que viram seu tráfego e receita despencarem após atualizações de algoritmo do Google, como o HCU.
Outros usuários, como gelleproductions, foram além, questionando a compreensão de Moulton sobre o impacto das atualizações do Google:
“Então o Google vai se tornar apenas um ‘invólucro’ de busca do Reddit? Reddit e Wikipedia são tudo o que aparece, mais alguns sites de notícias? Se ‘o mercado desapareceu’ para conteúdo baseado em texto, qual é o plano dele aqui? Ele realmente não entende o que o Helpful Content Update fez?”
Essa percepção de que o Google está, de certa forma, “terceirizando” a culpa pela queda na qualidade da internet, enquanto suas próprias ações e algoritmos contribuíram significativamente para a precarização do ecossistema de conteúdo, foi um tema recorrente nas respostas.

O papel do Google na crise: Uma análise crítica inevitável
Não é possível deixar de lado que toda configuração da Internet atual passa intimamente pelos processos e produtos criados pelo Google. De forma ativa, ele ajudou a transformar o jornalismo no que ele é hoje.
Então, as críticas direcionadas a Moulton e, por extensão, ao Google, levantam pontos que não podem ser ignorados em uma análise séria da situação:
- Impacto das Atualizações de Algoritmo (HCU e Outras): Muitos editores argumentam que atualizações como o Helpful Content Update, embora vendidas como focadas em “conteúdo útil para pessoas”, acabaram por penalizar de forma desproporcional sites menores e independentes, favorecendo grandes marcas e fóruns como o Reddit, mesmo quando o conteúdo dos primeiros era, em muitos casos, original e de alta qualidade. A sensação é que o Google “destruiu milhares de negócios de pequenos editores”, como afirmou Futia.
- Redução do Tráfego de Referência: A estratégia do Google de fornecer respostas diretas na SERP (Página de Resultados do Motor de Busca) através de featured snippets, AI Overviews e outros formatos, diminui a necessidade de cliques para os sites de origem. Se o tráfego, que é a principal via de monetização para muitos, é sistematicamente reduzido pela plataforma que domina a descoberta de conteúdo, é natural que o “mercado para escrever conteúdo” se contraia.
- Google Discover e a Priorização do Engajamento Superficial: Conforme discutido anteriormente, a plataforma Discover é frequentemente vista como um sistema que recompensa o clique imediato (CTR) e a viralização momentânea, muitas vezes em detrimento da profundidade e da qualidade editorial. Isso pode incentivar um tipo de conteúdo que não se alinha com o “jornalismo profissional” que Moulton lamenta estar em declínio.
- Permissividade com Conteúdo de Baixa Qualidade: A persistência de sites fraudulentos, spam e clickbait nos resultados de busca, apesar das promessas de combate a essas práticas, também é um fator. Quando conteúdo de baixa qualidade compete por atenção (e receita publicitária, muitas vezes via Google Ads) com jornalismo sério, o último fica em desvantagem.
O que será do futuro?
A projeção de Moulton para o futuro – dominado por poucos players, com foco em vídeo e o definhamento das notícias locais – é um reflexo do que muitos já observam. No entanto, atribuir isso apenas a uma falha de mercado do jornalismo, sem reconhecer o papel ativo das plataformas que controlam a distribuição e monetização da informação, é uma visão incompleta.
Mesmo comentários que concordam parcialmente com Moulton, como o de Roy Jossfolk Jr. (“De certa forma, ele não está errado. Conteúdo em vídeo é obviamente mais popular. A única vez que alguém quer conteúdo escrito é para fins de SEO”), são rebatidos com a realidade do consumo, como Futia aponta: “Você está engajando com conteúdo escrito agora mesmo. Por que não está assistindo a um vídeo em vez disso?” Isso evidencia que a demanda por texto de qualidade ainda existe, mas seu modelo de sustentabilidade foi profundamente abalado.
O Google precisa assumir sua parcela na equação
A discussão iniciada por Ryan Moulton é vital, mas a resposta da comunidade deixa claro que a narrativa não pode isentar o Google de sua responsabilidade. Se a qualidade da internet está em declínio devido à crise do jornalismo profissional, é imperativo analisar como as políticas e os produtos da principal porta de entrada para essa internet contribuíram – e continuam contribuindo – para essa crise.
Recentemente, temos acompanhado, inclusive, a própria empresa assumindo uma parcela de culpa em minar o trabalho dos pequenos editores. Ainda assim, no Brasil, diversos deles tiveram boa parte do seu tráfego perdido de forma repentina.
Não se trata de uma simples falha de “mercado” para o texto; trata-se de um ecossistema complexo onde as regras do jogo são amplamente definidas por um ator dominante. Qualquer discussão séria sobre a revitalização do conteúdo de qualidade online precisa incluir um exame crítico do papel do Google e um chamado para que a empresa assuma uma postura mais construtiva e sustentável em relação aos criadores de conteúdo que, por tanto tempo, alimentaram seus índices e geraram o valor que a tornou o que é hoje. A indignação expressa por muitos não é apenas sobre a perda de tráfego, mas sobre a percepção de um sistema que parece minar ativamente as fundações do conteúdo que alega valorizar.
Publisher do "Não é Agência!" e Especialista de SEO, Willian Porto tem mais de 21 anos de experiência em projetos de aquisição orgânica. Especializado em Portais de Notícias, também participou de projetos em e-commerces, como Americanas, Shoptime, Bosch e Trocafone.
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