A decisão do Google de abandonar acordos coletivos e buscar um novo modelo de financiamento para a mídia australiana sinaliza uma mudança de estratégia que pode favorecer grandes conglomerados e fragilizar publicações menores. O gigante da tecnologia anunciou o fim antecipado de um acordo com dezenas de veículos de notícias, buscando agora individualizar os pagamentos e distribuir um montante menor para um número maior de publicações.
O que aconteceu?
Em uma medida que testa o compromisso do governo Albanese com o News Media Bargaining Code, o Google notificou 24 editoras sobre o término de um acordo que distribuía pagamentos entre elas. Este contrato, que deveria durar de 2022 a 2027, foi negociado pela filantrópica Minderoo Foundation em nome da Public Interest Publishers Alliance. Embora o valor exato seja confidencial, fontes indicam que valia vários milhões de dólares por ano.
Quem foi afetado?
O término do acordo impacta diretamente os membros da Public Interest Publishers Alliance, um grupo que representa publicações de pequeno e médio porte que dependiam desses pagamentos para suas operações. Entre os afetados estão:
- Indian Link
- Neos Kosmos
- Renew Economy
- Time Out
- Australian Chinese Daily
- Hills to Hawkesbury
- The Australian Jewish News
- The Greek Herald
Por que o Google fez isso?
O Google justificou a decisão afirmando que uma “revisão interna abrangente” indicou a necessidade de “melhorar a acessibilidade do suporte” para pequenas editoras. A empresa planeia contratar um terceiro para distribuir os fundos de forma mais centralizada, alegando que o programa anterior exigia muitos recursos internos para gerir submissões, relatórios e processos financeiros.
O contexto: o News Media Bargaining Code
Criado em 2021 pelo governo Morrison, o News Media Bargaining Code visava corrigir o desequilíbrio de poder entre as big techs e as empresas de notícias. A legislação permitiu que o governo “designasse” plataformas, forçando-as a negociar acordos comerciais.
Para evitar a designação, Google e Meta negociaram acordos, pagando mais de US$ 200 milhões por ano às editoras australianas entre 2021 e 2024. No entanto, o Meta (Facebook) já anunciou que não renovará seus contratos, e o Google tem convertido acordos de longo prazo em contratos anuais.
O posicionamento do governo albanese
Em dezembro, o governo Albanese anunciou um “incentivo de negociação de notícias”, um pagamento adicional que cobraria mais das plataformas de tecnologia (incluindo o TikTok) caso não chegassem a acordos. Contudo, um documento de discussão sobre o funcionamento do incentivo ainda não foi lançado. O Tesoureiro Assistente, Daniel Mulino, afirmou que o governo “permanece comprometido”, mas está levando tempo para “fazer isso direito”.
Implicações para o cenário da mídia australiana
A decisão do Google pode ter sérias consequências, especialmente para a mídia comunitária e especializada, que representa comunidades italianas, gregas, judaicas, chinesas, indianas, LGBTIQ+, e meios focados em ciência, artes, clima e imprensa regional. Editoras afetadas expressaram “fúria”, pois tomaram decisões de negócios baseadas na expectativa de um acordo de cinco anos.
Paradoxo: grandes publishers favorecidos e desafios para vozes menores
A mudança de estratégia do Google pode favorecer os grandes publishers, que possuem maior poder de negociação individual, enquanto as vozes menores e mais diversas da mídia australiana enfrentam desafios de sustentabilidade.
Vantagem para grandes publishers
As grandes empresas de mídia, como a News Corp e a Nine Entertainment, possuem volume de conteúdo e audiência que pode dar a elas maior poder de barganha em negociações individuais. Com mais recursos jurídicos e financeiros, elas podem pressionar o Google por acordos mais vantajosos, retirando a “força do coletivo” que antes beneficiava os menores.
Desafios para vozes menores e diversas
Para as publicações de pequeno e médio porte, a situação é mais precária.
- Menor poder de barganha: Individualmente, o impacto de uma publicação menor na plataforma do Google é limitado, o que pode resultar em acordos com valores simbólicos ou nenhuma compensação.
- Recursos limitados: O processo de negociação individual é oneroso em tempo e dinheiro, desviando recursos que poderiam ser usados na produção de conteúdo.
- Risco de perda de financiamento essencial: A interrupção dos pagamentos pode inviabilizar operações e ameaçar a diversidade do panorama midiático, silenciando vozes importantes.
- Impacto na audiência: Sem acordos que garantam visibilidade ou remuneração, a capacidade dessas publicações de alcançar seu público e gerar receita pode ser ainda mais comprometida.
Em resumo, a estratégia do Google, embora justificada como uma busca por eficiência, recria um cenário onde os maiores players se beneficiam, enquanto os mais vulneráveis lutam pela sobrevivência.
O processo no brasil: a atuação do CADE
No Brasil, a relação entre plataformas e imprensa também é um tema em debate no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Desde 2018, o CADE investiga o Google por supostas práticas anticompetitivas. A Associação Nacional de Jornais (ANJ)argumenta que a exibição de trechos de notícias (“snippets”) desvia tráfego dos sites de origem sem a devida remuneração.
O debate no CADE gira em torno da obrigatoriedade de remuneração. Enquanto a imprensa defende o pagamento, o Google argumenta que a indexação gera tráfego gratuito e beneficia todos os lados. O julgamento do caso foi suspenso em junho de 2025 após um pedido de vista.
A situação no Brasil, assim como na Austrália, reflete a complexidade de regulamentar a relação entre as big techs e a mídia, buscando um equilíbrio que promova a concorrência e a sustentabilidade do jornalismo.
Publisher do "Não é Agência!" e Especialista de SEO, Willian Porto tem mais de 21 anos de experiência em projetos de aquisição orgânica. Especializado em Portais de Notícias, também participou de projetos em e-commerces, como Americanas, Shoptime, Bosch e Trocafone.
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