Análise: em vez de advogar, simplesmente, que Big Techs sejam punidas ou obrigadas a pagar fatias gordas aos governos, devemos entender, primeiramente, quais foram os males causados para quem elas os remediem.
Bater nas Big Techs é lugar comum. E fácil. Empresas como Google nem mesmo tem interesse em se defender das críticas. Não é Agência, por exemplo, raramente tem uma resposta sobre as diversas mazelas apontadas.
Entretanto, por ser fácil, não deveria significar que toda luta contra essas empresas é sadia. Em alguns casos, veremos apenas que algumas empresas, interessadas em seus próprios interesses, protagonizam lutas contra Bigs Techs que caminham ao lado oposto do interesse público.
Esse é justamente o ponto quando a empresa americana é investigada por tentar combater o chamado “SEO parasita”.
A investigação
De acordo com DW, o Google tem sido acusado por enterrar “alguns sites de notícias em seus resultados de pesquisa como spam”.
Nesse sentido, a chefe antitruste de UE, Teresa Ribeira disse que:
“Estamos preocupados que as políticas do Google não permitam que os editores de notícias sejam tratados de maneira justa, razoável e não discriminatória em seus resultados de pesquisa”.
“Investigaremos para garantir que os editores de notícias não estejam perdendo receitas importantes em um momento difícil para a indústria“, complementou.
Inicialmente, o ponto para incontroverso e mais uma prática danosa criada pela gigante contra os pobres portais de notícias.
Entretanto, a prática mostra que isso está longe da verdade.
A prática
O Google, que ainda funciona, de certa forma, em um binômio de autoridade e relevância, permitiu nos últimos anos que portais de notícias fizessem acordos com demais empresas. Nesse caso, as empresas que não contam nem com autoridade nem com relevância criavam conteúdo para hospedar nos sites dessas publicadoras.
Como resultado, tais páginas recebiam tratamento diferenciado pelo ranking do Google. Em vez de serem tratados pelo que realmente são, eram exibidas pelo que o Google realmente achavam que eram: páginas criadas por jornalistas capacitados, com o intuito de informar pessoas de maneira mais isenta possível.
Para exemplificar, o próprio Google mostrou o funcionamento desse tipo de prática, conhecida como SEO parasita:
Veja como funciona: Um spammer pode pagar um editor para mostrar seu conteúdo e links no site do editor, aproveitando a boa classificação do editor em um esforço para induzir os usuários a clicar em conteúdo de baixa qualidade.
Por exemplo, um site fraudulento de empréstimo do dia de pagamento pode pagar um site respeitado para publicar seu conteúdo, incluindo links para suas ofertas. Consideramos isso spam, porque tanto nossos usuários quanto nossos sistemas pensam que estão lidando com um site confiável, quando na realidade estão lidando com um golpista. Essa prática vem em muitos sabores, mas a essência é sempre a mesma: um esquema de pagamento para jogar projetado para enganar nossos sistemas de classificação e usuários.
Na mesma postagem, o Google mostrou portais que cediam espaços para que empresas publicassem conteúdos que, aparentemente, fossem tão relevantes quando aqueles criados por jornalistas profissionais.

O grande perigo, como as imagens acima ilustram bem, está nas empresas que ocupam o espaço. Além de terem puro interesse comercial, diferentemente de um conteúdo informativo padrão, eles frequentemente apelam ao click-bait e a mentira para atrair mais cliques.
No ano passado, por exemplo, a Forbes recebeu punição por esse tipo de prática. No Brasil, ela também foi comum de maneira distinta. Empresas de tecnologia criaram conteúdo com Inteligência Artificial em massa e hospedaram os artigos em grandes portais brasileiros.
Como resultado, os conteúdos, com qualidade duvidosa, ganharam relevância principalmente no Google Discover. A partir disso, as pessoas tomavam o conteeudo como crível, uma vez que contava com a chancela de uma grande publicadora, ainda que pouco de verdade existisse em cada um daqueles materiais.
Não é Agência tratou desse assunto de maneira exaustiva em várias oportunidades, veja:
ISTOÉ perdeu 63% do tráfego orgânico, segundo Similarweb; como isso aconteceu?
Grandes portais de notícias infringem documentações do Google para ter mais tráfego no Discover
O Google nada proíbe
Na argumentação, Ribeira insinuou que os editores podem estar perdendo receita importante por um possível tratamento injusto por parte do Google. Entretanto, cabe ressaltar, que diferentemente de AI Overviews e Modo IA, o Google conta com diversas funcionalidades para que os editores mostrem que determinado conteúdo é patrocinado.
Dessa maneira, os portais podem, de certa maneira, jogar a responsabilidade para o Google quanto ao tratamento daquele artigo específico.
Entretanto, via de regra, as empresas que buscam esse tipo de parceria procuram, justamente, um ambiente em que a distinção entre o conteúdo patrocinado ou criado por terceiros seja de difícil distinção por motores de busca e pessoas.
Eles conseguem alcançar altos índices de visibilidade e monetização, mesmo sem a qualidade e a autoridade necessárias, conquistando os louros de conteúdos criados por empresa e profissionais distintos.
Nesse sentido, a tática visa manipular tanto algoritmo como pessoas para que elas visualizem artigos que não teriam interesse se estivessem em portal diverso.
Com esse cenário, por mais que a remuneração seja interessante para certos publishers, ela deveria ser vista como indevida e imoral, uma vez que não parte dos princípios consolidados do jornalismo. Ao contrário, leva ao engano.
Por fim, deveríamos tratar com perplexidade quando entes públicos investigam empresas por fazerem exatamente o que se espera delas.
Ao Google a parte que lhe cabe…
Como pode-se. ver, é uma tática estranha investigar o Google justamente pelas poucas ações positivas que tomou nos últimos anos para tornar o campo editorial mais ético e responsável.
Em primeiro lugar, isso nos leva um ambiente comum: processar e apoiar processos ao Google independentemente da culpabilidade que a Big Tech tenha naquela matéria específica. Isso, além de não ser justo, pode nos levar a um caminho pior do que já estamos.
Os entes legislativos e judiciários precisam, essencialmente, entender como o Google tem colaborado para a deterioração do jornalismo de qualidade em cada nação, propondo os remédios constitucionais apropriados para cada caso.
Caso esse tipo de pensamento não exista em nossos legisladores e juízes, além de não resolver os problemas existentes, cria ainda mais distorções em um mercado já distorcido.
Mais distorções?
O tipo de legislação que deveríamos defender caminho no ponto oposto da atual investigação. Deveríamos ordenar, como base legal, quais são as práticas em que o Google deveria atuar, de maneira preventiva e corretiva, para manter um ambiente saudável e competitivo.
Ou seja: deveríamos incentivar e implementar leis para obrigar o Google a lidar com o abuso de autoridade. Caso contrário, mais distorções aparecem. Imaginem, por um momento, portais generalistas com grande autoridade e audiência no mercado. Esses portais, cedem pastas (subdiretórios ou subdomínios) para que empresas diversas produzam materiais sobre geladeiras.
Essas empresas desejam monetizar com compras efetuadas pelos visitantes. Para tanto, indicarão não os melhores produtos, mas aqueles que pagam as melhores quantias. Quando as pessoas pesquisam por “qual a melhor geladeira em 2025”, os primeiros resultados são desses grandes sites que venderam espaço em vez de portais especializados no assunto.
Dessa maneira, torna-se mais complexo para quem deseja criar conteúdo, de fato, relevante para pessoas e com experiência genuína conseguir o devido tráfego. Por outro lado, a tendência é de ainda mais acúmulo de tráfego por parte dos grandes portais.
Investigações como a adotada pelo União Europeia são como um banho de água fria em quem deseja um ambiente de notícias mais saudável e plural.
A crítica correta
Nesse sentido, a melhor crítica, ao meu ver, está no caminho contrário. As ações contra de abuso de autoridade, que ganharam força em 2024, foram completamente esvaziadas em 2025. Nesse sentido, mesmo em solo brasileiro, é cada vez mais comum ver grandes portais adotando de alguma forma tais táticas para aumentar seu tráfego e, principalmente, o faturamento.
Ou seja, o Google deve ser criticado justamente pela falta de força e empenho em continuar o que começaram. Nesse caso, todos que defendem uma Web mais ética e responsável deveriam estar ao lado do Google, cobrando, entretanto, mais força para coibir todas essas práticas.
Em vez de bater no grande gigante pelo fato de ser grande, devemos ter remédios constitucionais capazes de combater distorções e que todos os entes, inclusive os grandes, possam conviver em harmonia. Ações e investigações como a abordada aqui carecem de mérito, rigor e, principalmente, justiça. Não apenas com o Google, mas com todos afetados.
Publisher do "Não é Agência!" e Especialista de SEO, Willian Porto tem mais de 21 anos de experiência em projetos de aquisição orgânica. Especializado em Portais de Notícias, também participou de projetos em e-commerces, como Americanas, Shoptime, Bosch e Trocafone.
- Willian Portohttps://naoeagencia.com.br/author/naoeagencia/
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