A recente introdução do “modo IA” (AI mode) pelo Google, juntamente com os já presentes “AI overviews” (anteriormente SGE), está gerando um profundo desconforto e pessimismo entre especialistas e publishers de notícias.
Barry Adams, renomado consultor de SEO e crescimento de audiência para publicações de notícias, compartilhou recentemente suas preocupações após uma apresentação para um grande publisher nacional, pintando um quadro sombrio para o futuro do tráfego e da sustentabilidade do setor.
1. AI overviews: uma perda de tráfego gerenciável (por enquanto)
Os AI overviews, que fornecem resumos gerados por IA no topo dos resultados de busca tradicionais, já indicam uma tendência de redução de cliques para os sites de origem. No entanto, Adams pondera que, para publishers focados em notícias, o impacto inicial pode ser administrável. Por enquanto!
“AI overviews causam algumas perdas de tráfego, mas são superáveis para publishers focados em notícias. Os carrosséis de AI overviews e top stories são mutuamente exclusivos, então os publishers ainda conseguirão alcançar visibilidade e tráfego em notícias atuais.”
A exclusividade mútua entre AI overviews e os carrosséis de “principais notícias” (top stories) oferece um respiro temporário. Publishers que investem em cobertura de notícias factuais e de última hora ainda podem encontrar um caminho para o tráfego via Google. Contudo, a dependência dessa segregação é frágil e pode mudar a qualquer momento, conforme o Google refina suas integrações de IA.
2. Modo IA: a verdadeira ameaça ao tráfego de notícias
A grande preocupação de Adams reside no “modo IA” completo, uma experiência de busca totalmente imersiva e conversacional. Diferentemente dos overviews, este modo não parece fazer distinção ou proteger o conteúdo noticioso.
“O modo IA do Google, no entanto, não exclui notícias. Você pode perguntar ao modo IA pelas últimas notícias, e ele as resumirá para você. Você pode perguntar ao modo IA sobre um tópico específico de notícias, e obterá uma resposta detalhada.”
Ele complementa de forma categórica:
“O modo IA matará o tráfego para notícias tanto quanto matará o tráfego para páginas da web informativas. Embora os artigos sejam mostrados como fontes no modo IA, todos nós sabemos que os cliques não acontecerão lá.”
Aqui reside o cerne do pessimismo. Se o modo IA pode fornecer resumos abrangentes e respostas detalhadas sobre eventos atuais, o incentivo para o usuário visitar o site do publisher original diminui drasticamente.
A menção de “fontes” pode se tornar uma formalidade, com taxas de clique insignificantes, privando os publishers do tráfego necessário para sua monetização e para a construção de uma relação direta com a audiência. A qualidade superior das respostas no modo IA, em comparação com os AI overviews, torna essa ameaça ainda mais potente.
Adams nota: “ao contrário dos AI overviews, a qualidade da resposta no modo IA é excelente. É muito mais difícil (embora não impossível) obter uma resposta errada do modo IA“.
Nesse sentido, para um canal de notícias, ser citado ou não em um painel do Google não ajuda na monetização e, dificilmente, terá um valor futuro.
3. A monetização do Google e o apocalipse do tráfego
A implementação global do modo IA parece ser apenas uma questão de tempo, dependendo principalmente de como o Google planeja monetizar essa nova forma de interação.
“Assim que o Google encontrar o ângulo de monetização para o modo IA, ele será lançado globalmente em semanas. Tenho poucas dúvidas sobre isso. E o apocalipse de tráfego que isso causará aos publishers será extremamente doloroso.”
A velocidade com que o Google pode escalar suas inovações é um fator de grande apreensão. Se a monetização do modo IA priorizar manter o usuário dentro do ecossistema Google, como já acontece com voos, hotéis e outros produtos, o “apocalipse de tráfego” previsto por Adams pode se tornar uma dura realidade para muitos.
4. Google discover: um paliativo insuficiente?
Adams sugere que o Google pode tentar mitigar o impacto negativo através de outras superfícies, como o Google discover.
“O tráfego do discover ajudará a amenizar o golpe em grande medida, e é por isso que o Google está lançando o discover para desktop também. O discover se tornará a pedra angular do tráfego do Google para a maioria dos publishers.”
Embora o discover possa oferecer uma fonte alternativa de tráfego, ele é notoriamente volátil e baseado em algoritmos que os publishers têm pouco controle ou entendimento.
Confiar no discover como a “pedra angular” é trocar uma dependência arriscada (busca tradicional) por outra, possivelmente ainda mais imprevisível, e que ainda mantém o Google como o principal distribuidor.
De alguma forma, é um dos poucos pontos em que os Publishers poderão se segurar. Ainda assim, só poderão se segurar os que sobraram, uma vez que boa parte dos portais brasileiros tiveram grandes quedas.

5. A urgência de estratégias pós-Google
Diante desse cenário, a mensagem de Adams para os publishers é clara e urgente: é preciso buscar independência.
“Mas a mensagem é clara. Os publishers precisam focar em estratégias de audiência que excluam o Google como uma fonte confiável. A ênfase precisa ser em canais não-Google, conteúdo multimídia e tráfego direto da marca.”
Ele adverte que a adaptação será uma questão de sobrevivência:
“Nos próximos anos, muitos publishers não conseguirão sobreviver. O dano que o modo IA causará à indústria editorial será sentido por décadas.”
Este é um chamado à ação. Publishers que dependem majoritariamente do tráfego de busca do Google precisam diversificar urgentemente suas fontes de audiência, fortalecer suas marcas, investir em comunidades próprias e explorar formatos (como multimídia) que possam ser menos facilmente “resumidos” ou canibalizados pela IA.
Não é fácil. Nem será. Mas todos os portais precisarão ter estratégia sólidas para conseguir aquisições extra-Google. Os que não conseguirem, dificilmente, conseguiram se manter em pé no médio prazo.
6. A dor da apropriação e a incapacidade da justiça
O aspecto mais amargo dessa transformação, segundo Adams, é a origem do poder da IA do Google.
“E a parte mais dolorosa disso é que ele é construído sobre a produção da indústria editorial. O roubo em atacado de conteúdo para construir esses LLMs é diretamente responsável pela perda de tráfego que os publishers estão agora experimentando.”
A esperança de uma solução legal rápida também é pequena:
“A litigação será lenta e as resoluções virão tarde demais para salvar os publishers. A hora de pivotar para um ambiente pós-Google é agora.”
A ironia trágica é que o vasto corpo de conhecimento e informação criado por publishers ao longo de décadas, muitas vezes com grande custo e esforço, agora alimenta os modelos de IA que ameaçam sua existência.
As batalhas legais sobre direitos autorais e uso justo estão em andamento, mas o ritmo da inovação tecnológica é muito mais rápido que o da justiça. A recomendação de Adams é pragmática: não espere por uma salvação legal que pode nunca chegar ou chegar tarde demais. A mudança precisa começar imediatamente.
Quando tivermos CPIs e regras rígidas, provavelmente, os usuários já terão abandonado o sistema atual, o que limitará qualquer tipo de efeito.
O futuro desenhado por especialistas como Barry Adams é desafiador para os portais de notícia. A “confiança” do Google em sua IA contrasta fortemente com a crescente desconfiança e pessimismo daqueles que veem seu modelo de negócios fundamentalmente ameaçado por essa nova era da informação.
Vale lembrar que confiar no Google como um curador eficiente é temerário. Por isso, enquanto você quiser estratégias para ele, pense em táticas éticas, mas que funcionem.
Publisher do "Não é Agência!", Willian Porto tem mais de 21 anos de experiência em projetos de SEO, tendo participado de projetos em e-commerces, como Americanas, Shoptime, Bosch e Trocafone, além de Portais de Noticia, como Folha Dirigida e Central da Toca.